Existe uma célebre frase de um andarilho norte americano, cuja história inclusive virou filme, que diz o seguinte: “a felicidade só é verdadeira quando compartilhada”.
Trazendo-a para o mundo jurídico, podemos dizer que muitas vezes, na vida de um jovem advogado, “os honorários advocatícios só são reais quando compartilhados” com outros profissionais.
Brincadeiras à parte, esta é uma realidade bastante comum para a jovem advocacia, principalmente quando não se tem um histórico de advogados na família ou um padrinho/madrinha que possa indicar novos clientes ao advogado em início de carreira.
Nessa situação, uma alternativa que acaba sendo muito proveitosa para ambos os lados são os trabalhos e serviços realizados sob o modelo de parcerias, nos quais cada profissional contribui com alguma habilidade, conhecimento, dados, informações ou contatos que possam trazer mais clientes, mais serviços e, consequentemente, mais honorários para ambos.
Ocorre que ao trabalhar nesta sistemática, surgem muitas dúvidas a respeito das formalidades e sobre a forma de tributação dos honorários recebidos em parceria, uma vez que essa modalidade difere da atuação rotineira do advogado e da relação direta entre profissional/cliente, que agora passa a ter um terceiro envolvido, um intermediário/colaborador dos serviços jurídicos prestados.
Convém ressaltar que a própria OAB permite a realização de serviços advocatícios em regime de parceria, desde que estes sejam realizados em caráter eventual e que não constituam uma sociedade de advogados de fato, que possa confundir a terceiros. A respeito do assunto, citamos interessante trecho da decisão nº E-5.736/2021, do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP:
[…]
É possível o estabelecimento de parceria entre sociedades e advogados, desde que tenham caráter eventual sobre determinados clientes ou processos e que mantenham suas identidades separadas de modo a não induzir terceiros a erro, por entender se tratar de uma única sociedade de advogados.
[…]
Proc. E-5.736/2021 – v.u., em 28/04/2022, parecer e ementa do Rel. Dr. DÉCIO MILNITZKY, Rev. Dra. MÔNICA MOYA MARTINS WOLFF- Presidente Dr. JAIRO HABER.
Emissão da nota fiscal em parceria
Bem, estabelecida a possiblidade e a validade da prestação de serviços advocatícios sob o regime de parceria, cabe agora adentrarmos nos detalhes técnicos da emissão da Nota Fiscal de Serviços ao cliente, uma vez que haverá dois profissionais prestando o serviço e dividindo o preço pago.
Muitas vezes, ocorre que apenas um dos parceiros recebe os honorários correspondentes aos serviços prestados (geralmente aquele que tem mais contato com o cliente), repassando o percentual ou montante avençado ao outro advogado. Isto pode ocorrer tanto nos honorários contratuais, como também nos honorários sucumbenciais.
Sobre o assunto, recente atualização do Estatuto da OAB produzida pela promulgação da Lei nº 14.365/2022 trouxe a previsão do recolhimento dos tributos nos serviços advocatícios prestados sob a forma de parceria, mais especificamente em artigo 15, §9º:
Art. 15. Os advogados podem reunir-se em sociedade simples de prestação de serviços de advocacia ou constituir sociedade unipessoal de advocacia, na forma disciplinada nesta Lei e no regulamento geral.
[…]
§ 9º. A sociedade de advogados e a sociedade unipessoal de advocacia deverão recolher seus tributos sobre a parcela da receita que efetivamente lhes couber, com a exclusão da receita que for transferida a outros advogados ou a sociedades que atuem em forma de parceria para o atendimento do cliente.
[…]
Assim, pelo enunciado do artigo citado, se extrai que cada parceiro deverá tributar apenas aquele valor/receita que lhe coube no serviço, conforme avençado no contrato de parceria, podendo este se dar em valor fixo ou em percentual a ser dividido da forma que pactuarem. O restante do valor que não constitui sua receita, repassado ao advogado parceiro, deve constar como dedução em algum campo específico dentro da nota fiscal.
A problemática que trazemos neste ponto se dá em relação às sociedades ou aos profissionais que atuam sob a sistemática do Simples Nacional, uma vez que é de conhecimento de todos que neste regime, os tributos (alíquota) incidem sobre o faturamento bruto da sociedade, sem autorização de qualquer tipo de dedução.
Nesse sentido, acende-se o alerta para uma eventual atuação dos fiscos municipais a questionarem a emissão da nota fiscal pelo valor cheio/integral e a dedução de valores que não estão previstos na LC nº 123/2006, a fim de buscarem a tributação do ISS do valor correspondente ao faturamento bruto da sociedade no período discutido, desconsiderando-se os valores repassados a título de parceria.
Fisco não pode tributar valor integral
Contudo, nosso entendimento é o de que a alteração promovida pela Lei nº 14.365/2022 e o Estatuto da OAB trazem disposições específicas e especiais para a atuação dos advogados em regime de parceria, que aliadas ao princípio da non bis in idem (não bitributação) impedem que o Fisco tribute a integralidade do valor recebido pelo parceiro e também o percentual ou montante repassado ao advogado parceiro.
Acaso o Fisco pretendesse tributar tanto a integralidade do advogado que recebe os honorários, como o valor que é repassado ao advogado parceiro, estaria incidindo em evidente enriquecimento ilícito, ao impor tributação sob o mesmo fato gerador (prestação do serviço advocatício) de dois contribuintes distintos, o que é vedado pelo nosso sistema tributário.
Como solução a este impasse, sem desconsiderar a possibilidade da necessidade de uma eventual explicação ou demonstração à fiscalização tributária, é fundamental que os advogados parceiros façam constar nas notas fiscais de serviço que os honorários são oriundos de atuação em parceria, informando de preferência os percentuais de divisão e também qual o advogado parceiro que pertence o restante dos honorários recebidos e deduzidos da nota.
Deve-se atentar também para mencionar em algum campo da nota fiscal, como observação por exemplo, o artigo 15, §9º do Estatuto da OAB — Lei nº 8.906/1994, a fim de fundamentar legalmente a possibilidade de tributação correspondente ao exato valor/receita recebido pelo serviço prestado.
Tomando-se estes cuidados, é possível que os advogados, principalmente aqueles em início de carreira, promovam seus serviços sob a sistemática de parceria com outros profissionais sem maiores preocupações, sabendo que estão recolhendo os tributos de maneira correta sobre os seus serviços e protegendo-se contra